Uma das notícias do dia de ontem foi o regresso, há muito esperado, dos turistas estrangeiros ao Algarve. O aeroporto de Faro recebeu 25 voos que transportaram 7000 passageiros, 5500 dos quais britânicos, mas muitos mais são esperados até ao final da semana. A Região de Turismo do Algarve organizou um "comité de boas-vindas" oferecendo, a cada passageiro, um kit com 2 máscaras, álcool gel e guias da região. Os jornalistas nacionais também "acamparam" no aeroporto de Faro para acompanhar a tão ansiada chegada dos turistas e aumentar a comitiva de recepção aos turistas.
As imagens televisivas, o som das reportagens da rádio e as notícias dos jornais online só me inspiraram este comentário, "Para que é este exagero?!". Atenção, eu compreendo que os empresários e trabalhadores do sector turístico estejam muito satisfeitos com o facto de Portugal estar na lista dos países para os quais é seguro viajar. Este sector estava estrangulado, como é óbvio, mas o ano que passou devia ter ensinado que a economia não devia estar só assente no turismo e, principalmente, devia-se estimular o turismo interno. Pelo que sei, os preços praticados pela hotelaria não estão muito apetecíveis para o bolso português. Já devíamos ter aprendido que não se pode estar sempre à espera do que vem de fora. E, quanto a mim, esta subserviência era desnecessária. É que só faltou a Banda Filarmónica!!!
Como seria de prever, o sector do turismo é dos mais afectados pela pandemia. Em Portugal, a crise é ainda mais gritante porque, nos últimos anos, a nossa economia assentava neste sector, principalmente. No entanto, esta crise no turismo faz-se sentir, em maior ou menor escala, em todos os países.
Já há umas semanas que tenho reparado que muitos operadores turísticos têm apelado a que se faça férias "cá dentro" porque temos que ajudar a economia interna. Obviamente que a legitimidade deste apelo é indiscutível mas porque é que só agora é que os empresários se lembraram que os portugueses existem? Durante imenso tempo só se preocuparam em atrair o maior número de estrangeiros possível e nunca pensaram que o boom do turismo não era eterno. Os estrangeiros vão e vêm e podem deixar de vir mas os portugueses estarão sempre cá. Se calhar deveriam ter pensado melhor antes de estenderem a passadeira vermelha aos de fora e empurrar os de cá para a porta das traseiras.
Não se pense que isto é exclusivo deste nosso rectângulo. Em França, por ocasião da abertura dos museus, vi uma pessoa, não sei se seria o director, dizer que agora os parisienses teriam oportunidade de ir ao Louvre. Presumo que antes nem conseguissem chegar lá perto quanto mais entrar.
Moral da história: O melhor mesmo é chegar a um ponto de equilíbrio em que todos se sintam acolhidos seja onde fôr e seja qual fôr a origem de cada um.
Na minha última noite de serviço, que aconteceu na passada sexta-feira, atendi várias pessoas que não eram portuguesas. Mesmo durante o horário normal de funcionamento, temos reparado, eu e as coleguinhas, que cada vez atendemos mais estrangeiros. Sejam eles, brasileiros, angolanos, americanos e australianos a caminho de Santiago de Compostela, espanhóis, paquistaneses e até temos uma utente habitual que é italiana.
Ora e o que é que pensou a minha cabeça doida com poucas horas de sono?!
Pensei isto: "Aqui d' el Rei que os portugueses estão em vias de extinção."
Ontem realizou-se no Pátio da Galé, em Lisboa, a cerimónia dos World Travel Awards. E Portugal foi galardoado com nada mais, nada menos, 17 (!) prémios. Os nossos meios de comunicação social fizeram uma grande alarido com esta notícia. Fiquei assustada e preocupada porque comecei a temer que a invasão turística aumentasse exponencialmente com tantos prémios que se distribuem por todo o país. Também fiquei curiosa e fui tentar descobrir quantos prémios tinham sido distribuídos porque, da maneira como as televisões noticiaram, parecia que o país tinha dominado a gala. Afinal os prémios são tantos mas tantos que eu nem me os consegui contar. Podem encontrar a lista aqui. Vendo por este prisma, 17 prémios são uma gota no oceano. Podem-se escolher inúmeros destinos de entre os premiados. Felizmente.
Ontem à noite fui, mais uma vez, a Lisboa para assistir a uma conferência. O local é mesmo no centro de Lisboa, perto do Chiado. Era uma noite a meio da semana, relembro. E as ruad estavam cheias, cheias de pessoas. Imagino que a grande maioria seriam turistas. Já aqui falei deste assunto. Lisboa foi completa e exageradamente invadida. Acredito que este movimento será positivo para os operadores económicos da área do turismo mas tudo o que é demais...
Já não reconheço a cidade dos meus tempos da faculdade. É verdade que passaram 20 anos e que, em certos aspectos, Lisboa está francamente melhor. Infelizmente são cada vez menos os portugueses e os lisboetas que usufruem dela.
Nesse tempo longínquo em que eu ia todos os dias para Lisboa, haveria muitos comerciantes locais em dificuldades. Poderia-se pensar que agora estariam todos esses negócios antigos, alguns centenários, a prosperar. Mas, ao que parece, há cada vez mais lojas históricas a fechar. Uma das próximas a fechar é a icónica Pastelaria Suiça no Rossio. A Pastelaria Suiça é quase centenária já que foi fundada em 1922. Segundo parece, todo o quarteirão onde se situa a referida pastelaria foi comprado por um fundo imobiliário. Não acredito que este estabelecimento estivesse a ter prejuízo. Se estava sempre cheia antes, agora com tanta gente pelas ruas, deveria estar a abarrotar. Os preços não eram muito convidativos para a carteira de muitos portugueses, é uma verdade, mas já se sabe que há que pagar o enquadramento. Quando tomamos um café ou uma refeição com vista para o mar também se paga mais. Não será o único estabelecimento de Lisboa a fechar portas mesmo com a aprovação pela Câmara de mais 44 lojas classificadas como "Lojas com história" o que lhes confere uma maior defesa contra o encerramento. Mas há factores que não se conseguem ultrapassar. Se os proprietários já não quiserem continuar, por exemplo, pouco se pode fazer.
Na altura das Marchas Populares, também foi dito que a maioria dos participantes já não moram nos bairros típicos pelos quais concorrem. Também em Alfama fechará a última mercearia típica que ainda resiste. O prédio está degradado, é certo mas foi comprado, adivinhem lá, por um estrangeiro.
Dentro de pouco, Lisboa perderá tudo o que é típico, perderá a sua principal riqueza, os lisboetas, perderá os turistas porque se tornará numa cidade igual a todas as outras. Acontecerá a tal gentrificação, esse palavrão que entrou no nosso vocabulário.